Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

Like A Man

16 de Junho, 2017

Quando nos morre um pai!

Filipe Gil

Pai e filho Like A Man

É inevitável. Um dia acontece. Nunca queremos pensar nesse dia, de como vai ser, de como vamos saber, mas desde que ganhamos consciência da morte, desde putos, que temos isso presente: um dia o nosso pai vai morrer. E a mim aconteceu, faz hoje 4 anos. E por vezes parece que nunca aconteceu, mas outras tantas está demasiado presente. Para um homem, perder um pai é algo muito poderoso. Partilho convosco a minha experiência.

 

Desde que me lembro que sempre tive medo de perder o meu pai. Fruto da vivência com o meu melhor amigo, Nélson, que perdeu o pai muito novo. Lembro-me como se fosse ontem de ver o pai do meu amigo no hospital, pela última vez. Eu ia com uma camisola do meu glorioso SLB vestida e o meu amigo com a do Sporting. E, uns dias mais tarde dessa visita, lembro-me de ter ficado muito triste com a notícia da sua morte. Confesso que nos meses seguintes fiquei aterrorizado com medo de perder o meu também. Acho que até fiquei paranóico. Ia para a janela ver o meu pai chegar do emprego, ficava acordado quando ele chegava tarde a casa porque trabalhava por turnos. Mas fui gerindo esses medos. Às tantas veio a adolescência e o nosso pai passa a ser um "chato do caraças" que nos quer controlar e tirar os sonhos de juventude, como andar de mota ou fazer uma tatuagem. Felizmente! Porque nós, homens, em putos somos um pedaço parvos.

 

O medo de o perder foi-se esmiuçando até ao dia, em 1996, em que o meu avô morreu. Lembro-me de ter visto o meu pai chorar, o meu pai já com os seus 50 anos a chorar pela morte do meu avô - que estava perto dos noventa anos. Porquê tanta tristeza se o meu avô já era velhote? Lembro-me de ter pensado durante o funeral. Arrependo-me até hoje desse meu pensamento. Perder um pai, esteja ele com 40, 68 ou 87 é sempre trágico e marca-nos para a vida.

 

 

E eu perdi o meu faz hoje 4 anos, e de uma forma repentina. Sentiu-se mal, teve um ataque de coração fulminante, caiu para o lado depois de ter estado a espalhar o seu charme a dançar num arraial dos Santos. Foi-se! Acabou ali. 39 anos de relacionamento comigo e num ápice tudo se foi - o que é uma grande mentira, mas já lá iremos.

 

 

Lembro-me que nesse dia participei num treino de corrida no Parque das Nações e à noite fui para um arraial perto de casa. Lá, enquanto esperava pela comida troquei mensagens com ele, pelo Facebook Messenger, pela última vez. Conversa do costume, que hoje em dia me faz tanta falta. Não consigo ir a esse Arraial sem me lembrar dessa conversa.

 

 

Para um homem ver o pai morrer-se é algo que vai para além do que todos esperam quando se perde alguém querido. Eu era próximo do meu pai. Íamos ao cinema, gozávamos um com o outro com o futebol - ele sportinguista e eu benfiquista. Lembro-me desse início desse verão, há quatro anos, em que o meu Benfica perdeu tudo, Liga Europa, Campeonato e Taça de Portugal, e ele me ligou a perguntar: o que se passou? Sabia que, tal como qualquer sportinguista, não podia com o Benfica nem com molho de tomate, mas era sempre um diplomata comigo e sempre me apoiou a gostar das minhas coisas.

 

Ainda hoje, quando há um acontecimento desportivo de relevo, seja um jogo importante, uma conquista daquelas, por um segundo apetece-me ligar-lhe e comentar com ele. Custou-me muito ter visto Portugal sagrar-se Campeão Europeu de futebol e ele não. Por isso mesmo, peguei no meu filho mais velho e fui comemorar com ele. Para que ele nunca mais se esqueça! E também me custou ver o primeiro filme da saga Star Wars sem ele. Foi ele que me mostrou os filmes, que me levou ao cinema para ver a espada laser do Luke Skywalker. Merda, se me custou! E sempre achei que o meu pai era o Han Solo...

 


Mas quando nos morre um pai, começa outra vida. Passamos a saber que somos o próximo - daqui a muitos anos, espero. Passamos a ter uma breve esperança que um dia nos possamos voltar a encontrar noutra dimensão, noutro estádio. E passamos a olhar para os nossos filhos de forma diferente, tentando dar-lhes a mesma dose de amor, carinho e memórias futuras que nos foram dadas. 

 

 

Há pouco, umas linhas acima, referi que o relacionamento não acaba com a morte. Pois não. Todos os dias sinto o meu pai nas coisas que faço. Seja num pentear, numa resposta mais ríspida a outros, seja no relacionamento com os meus filhos. Sobretudo aí. Lembro-me das coisas que ele me fazia quando tinha a idade deles e tento, sublinho tento, fazer o mesmo. Estou a anos luz de ser tão bom pai como ele foi. Mas faço o possível para passar essa herança deliciosa aos meus filhos.

 

 

Dói muito não o ter por perto, dói para caraças não poder partilhar com ele o crescimento dos meus filhos, mostrar-lhes as parecenças físicas que têm com ele. É de uma tristeza atroz. Faz-me tanta, mas tanta falta, eu que tinha prometido a mim mesmo que quando ele fizesse 70 anos ia cuidar dele e retribuir as coisas que ele fez por mim. Foi-se embora dois anos antes. Uma merda.

 

 

No meio desta tristeza toda, há algo que me conforta. Juro que o sinto todos os dias. Sinto a sua herança, sinto-me próximo dele. Eu sou parte dele, e ele era parte de mim. Tal como os meus filhos são parte de mim e eu parte deles. Essa herança não desaparece. As saudades aumentam, mas o orgulho de ser seu filho é algo que permanece e cresce diariamente.

 

 

Curiosamente, tenho a imagem dele de quando eu tinha os meus 10 a 12 anos e um pouco mais tarde.  Um homem de olhos verdes que quando estava bem disposto era imparável nas suas piadas. Mas sobretudo um homem que me dava segurança, mesmo quando me criticava e duvidava das minhas capacidades. Uma segurança boa. A tal segurança que estou a tentar passar aos meus filhos. O amor não morre, transmite-se. E de um pai para um filho é eterno. O amor que o meu avô tinha pelo meu pai, passou por ele para mim e vai a caminho dos meus dois putos. Para que acima de tudo sejam homens bons, espertos e felizes. Tudo o resto sei que vão conquistar.

 

 

E como podem ver, o meu pai era um hispter. : )

o meu pai era um hipster Like A Man

Um grande beijo para ti pai, estejas onde estiveres. 

39 comentários

Comentar post

Pág. 1/3