"Ser homem hoje continua a ser mais fácil do que ser mulher"
Na Conversa de Homens de hoje o nosso convidado é Ricardo Martins Pereira, ou se preferirem O Arrumadinho, um dos bloguers portugueses mais conhecidos. O diretor da MadMen, empresa que detém a publicação digital NIT, fala sobre o futuro profissional, de já não ser jornalista, da sua paixão pelas corridas e sobre o que é ser homem e pai nos dias de hoje. A ler nas próximas linhas:
Como é ser homem português na atualidade? Mais fácil ou difícil que em gerações anteriores? Estamos hoje diferentes?
Sinceramente, acho que é mais gratificante. O homem hoje consegue ter uma amplitude de funções e responsabilidades que não tinha há algumas décadas, e, com isso, acabava por perder (às vezes até por desconhecimento) momentos e sensações únicas. Acompanhar todos os passos do crescimento de um filho, tratar dele de manhã, dar-lhe banho, o jantar, contar-lhe uma história antes de dormir, tudo isto são exemplo de tarefas que durante anos cabiam na área da mãe. Culturalmente era assim. E isso mudou, felizmente. Não significa mais trabalho para o homem, significa que o pai pode, hoje, experienciar sensações que os pais de ontem nem souberam que existem.Por outro lado, sinto que ser homem hoje continua a ser mais fácil do que ser mulher, embora muita coisa tenha mudado, muitas mentalidades tenham evoluído.
Continuamos a ser uns privilegiados no trabalho, com salários mais elevados, com mais tolerância ao erro, com mais disponibilidade para dar às empresas, com cargos de mais responsabilidade. Há menos desconfiança em relação aos homens, pensa-se em menos obstáculos quando se contrata um homem. Infelizmente, isso continua a acontecer.
E as mulheres portuguesas, estão diferentes da geração anterior? Para melhor ou pior?
As mulheres estão também elas diferentes, não necessariamente para melhor ou pior. Cada caso é um caso. Também as mulheres enfrentam um mundo diferente, com alterações culturais grandes, que vão mais ao encontro do que é justo em termos de igualdade de sexos, mas com os pesos da balança ainda muito desiguais.Há hoje muito menos mulheres que dominam as tarefas domésticas – para desgosto de algumas mães e avós – precisamente porque ocupam o seu tempo a trabalhar em empresas, a desempenhar funções que as consomem e lhes retiram tempo para outras coisas.Ainda assim, e tentando não generalizar muito, sinto que muitas mulheres de hoje são muito mais ativas, dinâmicas, interessadas, interessantes, divertidas, ousadas, e tudo isso é ótimo.
"O mais importante de tudo, para mim, é criar duas grandes pessoas, dois homens honestos, com bom coração, solidários, amigos, que acrescentam à sociedade por aquilo que são, por dentro, e não por aquilo que fazem no trabalho".
És pai de dois rapazes. Quais os valores que lhes passas? E o que incutes na relação entre eles?
O mais importante de tudo, para mim, é criar duas grandes pessoas, dois homens honestos, com bom coração, solidários, amigos, que acrescentam à sociedade por aquilo que são, por dentro, e não por aquilo que fazem no trabalho. Não quero criar génios da música, nem grandes gestores de empresas, nem advogados de topo, nem médicos que são contratados pelos melhores hospitais do mundo. Quero criar dois homens enormes. E é isso que lhes tento passar todos os dias. A serem justos e honestos, genuinamente bons, altruístas, educados. Se, como consequência de tudo isso, e também do trabalho que fazem na escola, alcançarem êxito nas suas profissões, melhor, e serei o pai mais orgulhoso do mundo. Mas nada me deixará mais vaidoso do que saber que eduquei duas crianças e as transformei em dois seres humanos exemplares.
És (também) conhecido por correres muito e fazeres várias maratonas por ano? Porque corres tanto? E quais os próximos objetivos, em termos desportivos, para 2017?
A corrida é uma paixão que começou em 1993, quando tive de deixar o andebol, que joguei dos infantis aos séniores. Queria continuar a fazer desporto, o ginásio aborrecia-me de morte, e comecei a correr. Nunca mais parei.Corro, sobretudo, para me libertar. A corrida é o meu escape, é aquele momento em que consigo estar sozinho comigo, libertar-me de tudo da minha vida, pensar a fundo em coisas a que não consigo dedicar minutos no meu dia agitado, e que precisam de ter o seu espaço.Normalmente, quando paro durante algumas semanas – porque também sinto necessidade de parar de tempos a tempos – começo a sentir efeitos secundários próximos da ressaca. Sinto uma necessidade extrema de encontrar esse meu espaço e esse meu tempo.A corrida é também uma fonte de criatividade. Muitas das ideias que tenho para trabalhos nascem durante as corridas. É também por isso que corro sem música, sem elementos de distração, que me desfoquem deste meu mundo.Sei, ao mesmo tempo, que a corrida me tornou numa pessoa muito melhor, mais resistente, resiliente, emocionalmente mais estável, psicologicamente mais forte, fisicamente mais ágil e dura.Para 2017 não tenho grandes planos. Gostava de correr pelo menos mais três maratonas — Lisboa, Porto e uma no estrangeiro — e tentar abordar pela primeira vez o triatlo.
Também és conhecido pelo teu blogue “O Arrumadinho” que recentemente sofreu uma reformulação. Quais os planos futuros para o blogue?
Gostava de, um dia, poder dedicar-me a 100 por cento ao meu blogue, construir uma plataforma como aquela que eu acho que ela deve ser, criar os conteúdos extraordinários que eu me imagino a criar, poder ter uma coisa verdadeiramente minha, onde possa colocar toda a minha dose de loucura, os meus disparates, devaneios, mas também ideias, teorias, opiniões, reflexões.Ainda assim, acho que esse tempo ainda não chegou. Por agora, e com as limitações de tempo que continuo a ter, quero apenas que o blogue seja um espaço meu onde, regularmente, vou falando sobre coisas importantes para mim, sejam ligadas à família, ao dia a dia, ao Benfica, às corridas, e ao lado bom da vida.
"O facto de existirem muitos blogues só torna o mercado mais apetecível. Há muitos? Verdade. Há muitos bons? Não, não há".
A blogosfera ainda faz sentido? Não há blogues a mais? Ou é ainda um universo mais feminino. Como pensas que vai evoluir?
A blogosfera faz cada vez mais sentido. O facto de existirem muitos blogues só torna o mercado mais apetecível. Há muitos? Verdade. Há muitos bons? Não, não há. Por isso, acredito que quem tem valor pode, com alguma facilidade, chegar longe, criar a sua comunidade, o seu posto de trabalho, fazer uma coisa só sua, assente nas suas ideias. Comercialmente também sei que o mercado está a virar, e a fatia de investimento em digital sobe de ano para ano. O bolo é cada vez maior, mas as fatias grandes serão para quem tiver mais qualidade, valor e leitores. Por isso, o caminho passa muito por aqui. É preciso é ser inovador, diferenciador e talentoso.
E como está a correr o projeto NiT?
A NiT está a correr extraordinariamente bem. Foi um projeto que começou como qualquer start up, com meia dúzia de pessoas (literalmente, éramos mesmo só seis), e que, com o tempo, foi ocupando espaço, ganhando terreno, criando nome, impondo a marca na comunicação social.Hoje, não tenho qualquer dúvida de que a NiT é o maior projeto nacional digital na área do lifestyle, um site referência para dezenas de milhares de pessoas, que tem já mais de 200 mil seguidores no Facebook e 50 mil no Instagram, e que cresce de mês para mês.Este crescimento tem-nos permitido investir mais na marca, contratando mais gente, gente com mais qualidade, com competências em áreas distintas, como o marketing, a programação ou o design, que acrescentaram valor ao projeto e à marca.No início deste ano, optei por deixar a direção da NiT e passar a ser apenas diretor-geral da MadMen, a produtora de conteúdos que detém a NiT, precisamente porque sinto que tenho de me dedicar ao new business, a área de negócio que são importantes para o crescimento da empresa, sobretudo na produção de conteúdos e definição de estratégias digitais. Já estamos a trabalhar com marcas importantes, e acreditamos que muito em breve vamos poder anunciar mais contratos fundamentais para que a MadMen se afirme, de vez, como a maior produtora de conteúdos digitais em Portugal. É esse o meu desejo e ambição.
Recentemente deixaste de ser jornalista. Já não acreditas na profissão, ou é apenas uma nova etapa profissional?
Deixei de ser jornalista porque a minha empresa, a MadMen, passou a dedicar-se à produção de conteúdos corporate, que envolve criar conteúdos para marcas e empresas, e isso é incompatível com a profissão.De qualquer forma, enquanto responsável máximo pela empresa, já passava 80 por cento do meu tempo a fazer coisas que nada tinham a ver com ser jornalista, por isso, sinto que deixou de fazer sentido ter carteira profissional.
"Não é preciso fazer reportagem de guerra na Síria para se ser um grande jornalista. Um grande jornalista era e é a pessoa que sabe ir ao fim da rua e trazer uma história que apaixone os leitores, telespetadores ou ouvintes".
Já agora, o que é ser jornalista em 2017? Ainda é uma profissão “romântica” e apaixonante? Ou nunca tiveste essa visão?
Nunca tive essa visão romanceada. Nem mesmo quando era um jovem estagiário. Um jornalista é uma pessoa que sabe contar histórias, seja em que formato for, e que consegue prender as pessoas a um conteúdo, que as informa, mas também que as agarra pela forma como escreve, como diz, como comunica.Não é preciso fazer reportagem de guerra na Síria para se ser um grande jornalista. Um grande jornalista era e é a pessoa que sabe ir ao fim da rua e trazer uma história que apaixone os leitores, telespetadores ou ouvintes.Isto é válido para uma pessoa que escreva num órgão de comunicação social, num blogue ou numa rede social. Mesmo não tendo carteira de jornalista, sentir-me-ei sempre um jornalista, e continuarei sempre a cometer atos de jornalismo.És um homem de mil projetos. O que vais fazer em 2017, quer a nível profissional, quer pessoal? Vêem aí algum livro novo?Quero muito que 2017 seja o ano em que a MadMen possa afirmar-se como um projeto de referência em Portugal na área da produção de conteúdos. Quero que a NiT tenha mais qualidade, produza conteúdos melhores, mais impactantes, memoráveis, mas também que entre na rotina das pessoas. Quero, por exemplo, que toda a gente ganhe o hábito de procurar na NiT pelo novo restaurante para jantar, que faça planos para essa noite com base nas nossas sugestões, mas também quero que esta linguagem NiT possa ser aplicada a muitos projetos externos.A filosofia NiT, com uma enorme força em social media, tem tudo para resultar na comunicação empresarial, e é esse o caminho que queremos seguir. Queremos que as empresas para as quais iremos trabalhar consigam ter conteúdos que façam as pessoas parar, que as apaixonem e interessem, queremos contar histórias que inspirem os outros, queremos perceber de que forma podemos ligar estas ideias e estas histórias a marcas e a mensagens que as marcas querem passar.Quero também que 2017 seja o ano de estabilidade e retorno financeiro para a empresa. Depois de dois anos de investimento, em que se conseguiu criar marca, gerar uma love brand, implantar uma filosofia de comunicação, chegou a altura de colher esses frutos e, com o retorno do investimento, podermos voltar a investir, mas mais na qualidade, contratando pessoas cirurgicamente, que sabemos que vão acrescentar valor à empresa e tornar os nossos produtos e conteúdos melhores. É só isso que quero.
BI:
Idade – 40.
Naturalidade – Setúbal.
Clube – Benfica.
Desportos preferidos – Futebol, andebol, atletismo.
Filme de eleição – When Harry Met Sally.
A música que nunca farta – "Lisboa Que Amanhece", Sérgio Godinho.
Prato preferido – Sushi.
Bebida preferida – Vinho tinto.
Top 3 da tua Bucket List –
- Fazer uma viagem de carro/comboio/mota do Panamá até à Terra do Fogo;
- Fazer um IronMan;
- Ter uma filha.