Conversa de homens: “Hoje em dia não faz sentido ser feminista nem machista”.
É uma das caras e vozes mais conhecidas do jornalismo desportivo em Portugal. Miguel Guerreiro, 45 anos, repórter da SIC, entra-nos pela casa nos diretos dos grandes eventos desportivos, nomeadamente de futebol. Mas nem só de jornalismo ou de futebol se fala nesta Conversa de Homens. Fala-se de motos, carros, e da condição feminina e masculina. A ler, claro!
Quais foram os trabalhos jornalísticos que mais gostaste de fazer?
O funeral do Eusébio. As pessoas foram para a rua com um grande sentimento, independentemente do clube pelo qual são adeptos. Saí para essa reportagem para ir na mota e ir relatando o que se passava, pensava que ia fazer um apontamento aqui ou acolá, mas acabei por estar em direto durante três horas. Foi uma epopeia! Curiosamente já fiz trabalhos mais curtos que me cansaram muito mais. No fundo, estás a ser os olhos das pessoas que estão em casa. Existiram alturas em que fiquei mesmo arrepiado com o que via. Descrever emoções é fantástico. Outro trabalho espetacular foi a chegada da seleção nacional de futebol a Lisboa depois de se ter sagrado campeã da Europa. Fui na mota a acompanhar o percurso e confesso que nem sabia que havia tanta gente em Lisboa. Foi impressionante.
E qual foi o trabalho mais stressante?
Os diretos são muito stressantes. Acontecem montes de coisas, às vezes em entrevista és confrontado por pessoas e não lhes podes responder. Por exemplo, há treinadores que levam as perguntas para o lado pessoal e começam a embirra contigo, e isso é stressante. E houve uma vez que fiz de emplastro do “emplastro”. Ele estava a roubar a atenção dos telespectadores e decidi ir para trás dele dizer o que tinha de dizer. Mas foi tranquilo.
E estão sempre a tentar perceber qual o teu clube, não?
Sou do Benfica para os adeptos do Porto, sou do Sporting para os adeptos do Benfica e sou do Porto para adeptos do Sporting . Quando vês por dentro o futebol, vês que os clubes e os adeptos são todos iguais e deixas de ter clube ou ligar aos clubismos.
E o futebol continua a ser uma coisa de homens?
Por vezes acho que não (risos). Agora sério, acho que é uma modalidade de família em que os pais tentam incutir a paixão pelos clubes aos filhos. O futebol é mais uma coisa de clubismo e menos da modalidade. É de homens? Às vezes os jogadores levam um toque do adversário e ficam logo a queixar-se…, estou a brincar (risos).
E as tuas colegas jornalistas são bem tratadas pelas gentes do futebol?
São. Aliás, até são tratadas com mais respeito do que os jornalistas masculinos. As jornalistas de desporto percebem muito do que fazem.
E ainda vale a pena ser jornalista nestes tempos que vivemos?
Mais do que tudo a monotonia tarda em aparecer. Levanto-me de manhã e nunca sei o que vou fazer, se reportagem, se diretos, etc.
Antes da SIC o que fazias?
Estou na SIC há 16 anos, sou formado em Economia e tenho mestrado em Gestão e quando acabei o curso fiquei a trabalhar na universidade para editar livros e sebentas de professores. Depois fui para a cooperativa de ensino que geria a universidade Autónoma. Tinha gabinete, etc. Tratava de contratos. E havia dias em que me levantava da cama e não me apetecia vestir o fato e ir para lá. Com 25 anos não me apetecia fazer aquilo. Tentei ir-me embora da Universidade mas na altura ofereceram-me para ir dirigir o pólo da Boavista da Universidade Autónoma. Aquilo entrou nos eixos e passados seis meses pedi para ir embora. Fizemos as contas e fui para o desemprego. Depois fui para a Geotur, entrei na parte das finanças. Numa área mais empresarial havia um controlo de gestão zero, e eu com mais dois recém-licenciados da Católica estivemos a resolver os problemas. Foram fins-de-semana passados a trabalhar nisso. Na altura em que as coisas começam a ficar mais organizadas, comecei a ficar aborrecido. Entretanto o CNL, Canal de Televisão de Lisboa, começou a arrancar, tinha lá alguns amigos que me disseram que precisavam de jornalistas para a parte de Economia. E aí aprendi a ser jornalista de televisão. Mas gostava também de um dia experimentar rádio.
E gostas de outro tipo de reportagens sem ser futebol?
Sim, de surf, de atletismo. Tive por exemplo a oportunidade de fazer as narrações em direto das provas de ciclismo e triatlo dos Jogos Olímpicos do Rio para a Sport TV, e adorei a experiência. Estive seis horas e meia a comentar a prova de ciclismo de estrada. Eu e um comentador. Foi um grande desafio.
Pode-se dizer que tens uma relação especial com o desporto?
Sim, tenho. Comecei a fazer surf com 14 anos, joguei andebol federado no Liceu Pedro Nunes, antes fiz judo também federado. O que é curioso porque não tenho ninguém na família ligada ao desporto. Mas sempre, desde criança, passava os fim-de-semana a ver jogos de futsal, inscrevia-me nas corridas no bairro de Campo de Ourique, até ganhei uma prova.
E agora decidiste apostar no triatlo?
Fiz uma reportagem com a Vanessa Fernandes em 2007, quando ela bateu o recorde de conquistas de provas na Taça do Mundo - record que ainda é dela - e aquele trabalho cativou-me. A disciplina e o sacrifício de acordar cedo... achei aquilo engraçado. E fiquei a dar-me muito bem com um dos atletas, o Bruno Pais, e de vez em quando ia dar uma volta mais ligeira com os atletas federados. Hoje em dia com calma estou a gostar da disciplina do triatlo.
Como é a tua rotina de treinos?
Tenho um plano de treinos, mas por vezes por motivos profissionais, tenho que os adaptar às consequências. Se de manhã não tenho tempo para nadar e andar de bicicleta, faço bicicleta à noite em casa. Tenho rolos em casa e à noite ando de bicicleta a ver televisão. E corro três vezes por semana.
E ainda tens tempo para namorar e estar com os amigos?
Sim, claro!
Mas é um dia-a-dia intenso?
Sim, mas por exemplo, não gosto de ler, tenho uma grande dificuldade em concentrar-me. Leio um parágrafo e começou a imaginar coisas e se o livro vai para um caminho diferente do que aquilo que estou a imaginar, aborreço-me e desisto. E também não gosto muito de séries. Para além do “Californication” e do “Home Land”, não tenho paciência para seguir intensamente. A SIC Notícias é uma boa série para seguir (risos).
És solteiro. E casar, pensas nisso?
Não me quero casar.! Acho que o casamento até se torna um peso. Duas pessoas podem ficar juntas para sempre sem terem que se casar. Mas gostava de ter filhos. Tenho sobrinhos e adoro crianças. Claro que com filhos a dinâmica do desporto e dos treinos vai alterar-se. É algo que penso, mas quero ter filhos.
É mais fácil ou difícil ser homem hoje em dia do que no tempo dos nossos pais?
É mais fácil agora. Há menos barreiras, não é tão vincado no aspeto de um homem tem de fazer isto ou não pode fazer aquilo, por isso acho que hoje é mais fácil ser-se homem, tal como é mais fácil ser-se mulher. A maior igualdade de géneros derrubou algumas barreiras.
Mas achas que o homem está com menos espaço na sociedade?
Homem que é homem não se preocupa se está a perder ou não espaço na sociedade. É como ser chefe, não se preocupa em ter de dar ordens. Tem de ser uma coisa natural. Hoje em dia não faz sentido ser feminista nem ser machista. Claro que há ainda sociedades retrógradas que acham que as mulheres não devem ter os mesmos direitos dos homens. Mas não é o nosso caso.
E falando de motas. Sempre gostaste de andar de motas?
Quando tirei a carta de condução o meu objetivo era tirar a carta de mota, até porque já andava de 50cc, mas o meu pai não deixou. E andei uns anos de carro, o que dá mais jeito para levar a prancha de surf. Mas há uns sete anos comprar outra vez mota e não estou nada arrependido de ter comprado a minha Vespa 300cc. Aliás, em 2012 roubaram-me o carro e andei muito tempo só com mota. À chuva, ao sol, ao frio, sempre!
E porque escolheste uma Vespa?
Quando andava de mota a coisa nem sempre corria bem. Era muito acelera, gostava de andar depressa, por isso decidi comprar uma scooter que é o ideal para andar na cidade e com mais calma. Na andei a ver umas Piaggio mas o vendedor convenceu-me a gastar um pouco mais e comprar uma Vespa. Uma Vespa preta, mas por engano veio uma de cor branca mas fiquei com ela porque gostei muito.
Mas também gostas de carros clássicos?
Acho um desperdício de dinheiro comprar um carro novo. Sais do stand e já está a desvalorizar. Por isso gosto de comprar carros com pouco valor comercial. Atualmente, tenho uma carrinha Volvo V70 de 1998 e adoro. E nunca me deixou ficar mal! E ao contrário do que acontece nas motos não sou acelera nos carros, gosto de fazer viagens de carro. E este gasta pouco e tem muito espaço.