A praia
Como a grande maioria dos portugueses, adoro praia. A praia não me é só descanso e prazer de olhar o azul. Ou mesmo o amarelo da areia fina, para mim a melhor areia do mundo, da longas praias da Costa. A praia para mim é uma coisa muito boa, e boa é a Costa. A Costa que começou em São João, quando era criança e vai até à Fonte da Telha, onde, na maioria das vezes, levo os meus filhos. Essa é a minha praia.
Mas a praia é-me mais do que isso. São memórias boas. Memórias de família. Memórias do meu pai e dos meus tios e primos, memórias de jogatanas de futebol na areia dura da maré baixa. ao final da manhã. Na altura, quando os jogadores profissionais de futebol eram mais velhos que eu e os cabos do mar nos fiscalizavam o "esférico".
Lembro-me de ver o meu pai jogar, com a elegância que vi a poucos. Mais elegância do que jeito, e por isso preferia ir à baliza improvisada com dois montes de areia para poder ficar a olhar largos minutos para ele. Ele e a bola.
Já o meu tio, que tinha sido jogador de futebol profissional nas antigas colónias e depois no Oriental de Lisboa, era um talento nato. Era como ter o Maradona ali ao lado em calções de banho. A bola para ele não tinha segredos. De tal forma que os passou aos filhos, os meus primos, que ainda estou para saber por que razão nunca foram jogadores profissionais de futebol.
E a praia era isso. Era olhar para o futuro. E eu magro. Muito magro a pensar como seria a praia do futuro.
A praia era também a parte que menos gostava, quando os meus pais nos enfiavam num carocha sem ar condicionado e onde eu e a minha irmã adormecíamos exaustos e suados ainda antes de chegarmos à Ponte. Com sorte, levavam-nos ao colo até casa e só depois nos acordavam para tomar banho. Que felicidade esses mimos.
A praia para mim era também o pós-praia quando por vezes invadíamos a casa de uns tios que moravam ali perto da Costa, tomávamos banhos de mangueira e depois contávamos os minutos para ver a série original “V- Batalha Final”, ou então aquele jogo do Mundial ou Europeu a puxar pela seleção que mais simpatizávamos na altura, fosse a Holanda ou o Brasil. A portuguesa, na altura, nem sequer nos jogos de máquinas arcádia aparecia como alternativa.
Ainda este fim-de-semana, quando fiz praia pela primeira vez em 2018, me recordei disto tudo. Com saudades desses tempos e com a certeza que foram dos anos mais felizes da minha vida. E pena, muita também, dos meus filhos não poderem ver o avô a tratar a bola com a tal elegância. Já lá vão cinco anos, feitos no sábado passado. E apesar de ter de aceitar, é como uma doença crónica. Sempre presente, como um buraco no peito. Fica a alegria dele estar sempre presente. Em mim e nos meus. E na praia. Naquela praia.