A morte de Anthony Bourdain deixou o mundo em choque. Espanto e incredibilidade marcaram as horas (dias?) após o anúncio do suicídio do chef e apresentador de “No Reservations”. E nós não fugimos à regra. E ficámos a pensar.
Numa altura em que tanto se fala em morte clinicamente assistida, não deixa de ser tristemente irónico que um homem com o carisma e sucesso de Bourdain tenha escolhido pôr termo à vida fazendo uso do seu livre arbítrio e do facto de estar em pleno uso das suas capacidades físicas. Porquê? Numa análise simplista, porque pôde. Estava fisicamente apto para tal e emocionalmente instável para o desejar.
O mundo lamenta a opção e, agora, abre o debate sobre a depressão, ao que parece uma sombra sempre presente nos últimos anos da vida da estrela de televisão.
A forma como esta doença invisível é tantas vezes negligenciada revela-se ao mundo em episódios tristes como este, que no caso de Bourdain terá resultado de uma perigosa combinação de fragilidade emocional com consumo excessivo de álcool e, dizem, drogas.
Neste diz-que-disse, importa mais o resultado final – perdemos um tipo cool que gostava das coisas autênticas da vida, mesmo que não fossem as mais populares entre a elite culinária – mas importa, sobretudo, não negligenciarmos as causas. Só assim podemos aprender com situações como esta e evitar que se repitam.
O Filipe já aqui escreveu em tempos sobre a depressão e hoje, ao reler, fica muito evidente a relação entre o que escreveu e o que se poderá ter passado com Anthony Bourdain e, com toda a certeza, acontece com muitas pessoas à nossa volta, sobretudo homens que, por serem muito “machos”, não procuram ajuda nos momentos de maior fragilidade. Não quero com isto dizer que terá sido o caso do Chef e estrela de TV, até porque não tenho dados para isso. Mas estou certo que será uma situação recorrente, esta de não procurar ajuda porque será um sinal de fragilidade. E tanto vale para homens como para mulheres.
Muitas vezes estamos demasiado fechados na nossa bolha para pedir ajuda. Achamos que os outros estão demasiado ocupados para nos escutarem. Os filhos precisam de nós e não há tempo para “mariquices”. Se nos focarmos no trabalho ele vai “salvar-nos”. Vamos de férias que isso passa. Postamos fotos bonitas no instagram para sacarmos likes que nos vão fazer sentir melhor. Bebemos para esquecer. Drogamo-nos para não sentir. Enfim.
Podia, com propriedade, dizer-se que é um problema que resulta da sociedade moderna, em que temos tudo para estarmos mais próximos uns dos outros, mas estamos mais afastados do que nunca. Em que a cultura do “parecer” é mais relevante do que a do “ser”. Mas a verdade é que tudo isto é efémero. O “sucesso” nas redes sociais é com certeza, mas também o é a própria vida, os problemas e até a depressão. Ou poderá ser, caso procuremos ajuda.
Aquilo que será visto como um sinal de fraqueza é, pelo contrário, uma prova de força. Força de vontade e, sobretudo, de viver. Com a qualidade que todos merecemos.
Que este momento infeliz seja mais um exemplo do que (não) devemos fazer perante a adversidade. A ajuda pode estar literalmente à distância de um telefonema. Para um amigo, um familiar ou para um estranho, que está do outro lado para ajudar.
SOS Voz Amiga
800 209 899